De volta à honra de nascer fêmea

Há um chamado no ar, algo que nos conduz a farejar o Feminino Essencial. Estamos com saudades desta instância poderosa que tem sua fortaleza, justamente, ao acolher, ao cuidar, ao perceber o milagre da vida em si, pleno, explícito. Estamos com saudades depois de séculos de competitividade, individualismo, supremacia de uns sobre outros, separatividade, valores masculinos doentes... Estivemos doentes também entre as fêmeas. Fomos e somos capazes de nos queimarmos vivas umas às outras...
Mas o mundo hoje começa a desejar bem mais do que isso. Mulheres e homens querem fazer as pazes com as questões de gênero e se reintegrarem neste recente chamado cósmico. E a resposta mais regeneradora nesta jornada de recuperação é encontrada em grupos organizados por profissionais que elegem o Feminino como proposta de desenvolvimento. Grupos que conduzam a rituais de iniciação aos mistérios do ser mulher e qualifiquem a honra de se nascer fêmea, condutora da vida.
Absoluta deseja dar visibilidade a esses processos históricos da construção do Feminino doente e seus recentíssimos espaços de regeneração e cura. O texto a seguir foi base de uma roda
de conversa que realizamos na Série Encontros Absoluta, com a psicóloga Rute Rodrigues, e é um dos mais lidos em nosso site.

Há um movimento e um chamado no ar, algo que nos conduz a farejar o feminino. Ouvimos, aqui e ali, pessoas dizendo que apreciam a delicadeza, a suavidade desta ou daquela mulher. Homens e mulheres que querem encontrar colos, empatia, amorosidade. Respeitam, sim, as mulheres decididas, as que estão assumindo o poder. Não se trata de uma exclusão ou, muito menos, de se perceber estas características como mutuamente excludentes. Mas trata-se de uma sinalização de que sentem uma atração pela doçura, que não tem nada a ver com fragilidade, mas a fortaleza de mulheres que conseguem estar no público e manterem-se femininas.
Parece que estamos cheios deste mundo que nos instiga a "cada um por si e 'deus' por todos". Enquanto deixamos para um "deus" longínquo o cuidado conosco, sofremos o desejo de um contato terno, respeitoso, que nos reconheçam como seres humanos e, portanto, dignos de serem tratados com amorosidade, dignidade. Encontramos nestas pessoas uma inspiração a nos tornar também, este colo, este ser amoroso que cuida de si e percebe o outro a ser cuidado.
Tudo isto nos diz da saudade do Feminino Sagrado, desta instância poderosa que abraça o outro com o olhar, com a paciência, com compaixão e vê na existência de cada um o milagre da vida a ser cultivada. Característica possível a homens e mulheres mas que é podada pela cultura que valoriza a competitividade, o individualismo, a supremacia de uns sobre outros e a separatividade, tão peculiares da cultura patriarcal.
As próprias mulheres duvidam que estas qualidades não as enfraqueçam, por abrirem portas a abusos, pois ainda confundimos amorosidade e pureza com sermos ingênuas e manipuláveis. Temem que vivenciar e demonstrar tais características seja uma face perigosa para suas conquistas no mundo contemporâneo que valoriza o pensar lógico e linear e que, aos poucos, redescobre e valoriza as leituras sistêmicas ou complexas - por que não caóticas? - da vida.
Muitas mulheres ainda desconfiam que criar e contribuir com um mundo afetivo pode ser perigoso. Para estas, devemos nos manter alertas e atentas, pois a doçura esconde segundas intenções; ou desdenham que possamos aprender umas com as outras. Parece tão louco o que percebemos, mas isto ainda é vento que sopra e traz os gritos das nossas antepassadas que foram queimadas nas fogueiras pela Santa Inquisição.

A união dos círculos femininos foi violentamente atacada nesta passagem histórica. A vivência da irmandade foi rompida quando muitas das que teciam conosco, preparavam as ervas de cura, ou compartilhavam seus conhecimentos sobre os nascimentos, denunciaram umas às outras por conta da pressão de salvar a própria pele. A desqualificação do feminino - que já ganhara território pela queda do culto à Deusa - veio atingir às mortais, veio romper a força da união feminina de modo sanguinário, deixando uma devastação e uma ferida genocídia no gênero que representa a Deusa.

Como não olhar torto até para as terapias complementares que carecem do aval da medicina ortodoxa? Como distinguirmos as renovações de alternativas eficazes do mero oportunismo comercial? Como permitir confiar novamente no saber intuitivo e misterioso que não entra no crivo cartesiano (se isto, então aquilo)? Fomos e somos capazes de nos queimarmos umas às outras, vivas. São milhares os meandros de sufocamento e devastação do valor do feminino a partir da força bruta que nos fez temer sermos mulheres e temermos as outras mulheres, bruxas desvairadas que devem ser contidas e queimadas! O poder de compreender visceralmente os ciclos de vida/morte que as mulheres representam, contém e atualizam da existência, ficou encarcerado à maternidade e desqualificado no sangue menstrual - que muitos ainda lutam para extinguir por não compreenderem sua função.

A inteireza, de novo - Alguns caminhos para fazermos as pazes com o feminino são percebidos. O prazer de sentar e conversar temas tão peculiares como amores, filhos, família, romances, ou simplesmente compartilharem um lanche, receitas, arrumarem-se, trocarem opinião sobre esta ou aquela roupa, cabelo ou maquiagem, são os enredos de momentos intensos da necessidade de partilha da mulher, com outras mulheres. Momentos em que se revigora a união e a partilha feminina. Pequenos rituais entre amigas que sabem que existe um código todo próprio da expressão do feminino que só prende e interessa às mulheres, são verdadeiros Momentos Marisa - de mulher para mulher.

Para outras que desejam ampliar ainda mais esta jornada de recuperação, a resposta é encontrada em grupos organizados por profissionais que elegem o feminino para propostas de desenvolvimento. Propiciam o resgate desta instância em grupos que, em excelência, acolhem a individualidade de cada participante, mas convidam também ao despertar de arquétipos que devolvam a inteireza da vivência feminina, que dissolvam distorções da identificação maciça com os valores retilíneos da cultura patriarcal, que promovam a revalorização dos sentimentos, da sensibilidade, da intuição, da cooperação e respeito mútuos.

Grupos que conduzam a rituais de iniciação aos mistérios do ser mulher e qualifiquem a honra de se nascer fêmea, condutora da vida. Que acolham luz e sombra do feminino como necessárias à percepção aguçada da mulher sobre si e sobre a realidade. Espaços de regeneração e cura que pulsem a urgência das mulheres resgatarem seu legado de cura e que permitam, assim, a consideração dos espaços sagrados internos e externos neste momento de recuperação dos valores de vida que a Terra grita em alertar necessitarem ser retomados.
O Feminino Divino compõe a inteligência afetiva que todo habitante deste planeta pode lançar mão nesta queda livre que nos assola. Neste ponto da trajetória da nossa espécie, os dotes femininos de fusão tornaram-se obrigatórios para que a humanidade consiga continuar absolutamente presente. A retomada do Feminino Sagrado, resgatada a partir das mulheres, gira um novo ciclo que envolve também os homens, perpetua aos nossos filhos e aos filhos de nossos filhos a passagem para mudanças que venham trazer esperança de garantir sobrevivência harmoniosa a todos!

Rute Rodrigues
Psicóloga, terapeuta familiar, de casal e individual, com formação em Biodanza e Gênero, Arquétipos e Organização Biocêntrica pela Internacional Biocentric Foundation
Fundadora da ONG Rinaci (www.rinaci.org.br)
rutepoa@terra.com.br
PORTO ALEGRE/RS

Fotos
www.worth1000.com

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